Artigo 1. Nós, crianças, não somos adultos
pequenos. Nessa medida somos diferentes em nossos gestos, preferências e,
certamente, em nossas leituras.
Artigo 2. Nós crianças não somos nem ternos,
nem limpos, nem organizados, e nem “ajuizados”, nem “eternamente alegres”,
todas essas coisas são invenções dos adultos. Nós crianças, somos seres
humanos, e igualmente, vivenciamos todos os tipos de problemas.
Artigo 3. Nós, crianças, sabemos que as coisas
acabam, que nem toda gente é feliz, que há muitos que sofrem, enfim, que o
mundo não termina nos sorvetes e nos jogos de bolas e bonecas.
Artigo 4. Nós, crianças, não somos estúpidos. E
discordamos daqueles que nos tratam como incapazes. Daí exigirmos da parte dos
adultos uma linguagem normal, sem diminutivos ridículos e sem frases de efeito.
Parágrafo:
Da mesma forma ficam proibidos eufemismos e as denominações indiretas para
nossos órgãos sexuais ou necessidades fisiológicas.
Artigo 5. Nós crianças consideramos uma
violência à nossa imaginação querer nos mostrar um mundo ou uma realidade cor
de rosa, de belezas falsas e despojada de todo tipo de contradições.
Artigo 6. Nós, crianças, não somos
“palhaços" para os adultos. E nos negamos a ser animadores de reuniões
familiares. Por isso mesmo renunciamos a condição de objeto de exposição.
Parágrafo: É uma ofensa grave para nós e para literatura ter que recitar diante das visitas.
Parágrafo: É uma ofensa grave para nós e para literatura ter que recitar diante das visitas.
Artigo 7. Nós, crianças, temos o direito de ver
o mundo em tamanho natural; e nem sempre em miniatura.
Artigo 8. Nós, crianças, denunciamos a zoologia
da fábula imposta pelos adultos, como único caminho para nos explicar as
coisas.
Artigo 9. Nós, crianças, exigimos nos livros
preferencialmente feitos para nós, imagens menos óbvias e menos bobas. Não
queremos em nossos livros ilustrações supérfluas.
Parágrafo: É mentira que dos livros só as imagens nos interessam.
Parágrafo: É mentira que dos livros só as imagens nos interessam.
Artigo 10. Nós, crianças, consideramos que os
bons somente bons e os maus somente maus só existem na cabeça dos escritores
adultos.
Artigo 11. Nós, crianças, pensamos que as lições
de moral e os finais felizes são os finais mais chatos e menos emocionantes.
Artigo 12. Nós, crianças, lemos com todo nosso
corpo, não só com nossos olhos. Por isso consideramos um desrespeito à nossa
intimidade sermos obrigados a ler sentados ou em pé.
Artigo 13. A nós, crianças, encanta-nos a ação e
o movimento. Gostamos do que salta e pula, e do que sonha e brilha. Se tem um
livro que nos atrai é aquele que pode fazer parte de nossas brincadeiras.
Parágrafo:
Somos fantásticos, mas por excesso de realismo.
Artigo 14. Nós crianças temos o direito de
começar e abandonar a leitura de um livro, por e em qualquer parte.
Artigo 15. Nós crianças também temos corpo. Nos
excitamos, nos acariciamos e desfrutamos nosso corpo como qualquer diversão.
Por isso detestamos os livros que escondem nossos órgãos ou nossas partes mais
sensuais.
Artigo 16. Nós crianças gostamos de terror, dos
monstros e das sombras, amamos o insignificante e o inútil. Não cansamos com
facilidade nem temos sono às primeiras horas da noite. Somos tanto imprevisíveis
quanto inesgotáveis.
Artigo 17. Nós, crianças, lemos de muitas
maneiras e vários tipos de livros. A televisão, por exemplo, é um desses. Nós
crianças somos multileitores e tal qualidade deve ser respeitada pelos adultos.
Artigo 18. A curiosidade das crianças é um
direito que deve ser respeitado pelos adultos. As respostas pela metade,
incompletas, são faltas graves contidas nesta Declaração de Direitos da Criança Leitora.
Artigo 19. Nós crianças nos recusamos a ser a
ilusão perdida dos adultos ou a nostalgia de nossos pais. Nós crianças não
podemos ser sentimentais.
Parágrafo:
Não podemos ser o que nossos pais não foram ou não conseguiram ser.
Artigo 20. Nós, crianças, gostamos de encontrar
nos livros que lemos palavras raras, desconhecidas, sonoras, misteriosas. Por
isso mesmo são ofensas para nós os "glossários" e
"vocabulários" postos ao final ou abaixo dos textos. Declaramos que
nós, crianças, não somos retardados ou incapazes de entender a língua. Os
"Dicionários para crianças" não têm valor para nós.
Artigo 21. As crianças, como a grande literatura
tem mostrado, são obscenas, cruéis e zombeteiras mesmo que os adultos neguem.
Parágrafo:
É proibido referir-se a nós com adjetivos culposos.
Artigo 22. Não há temas para crianças. A
fantasia e a imaginação não têm castas e etapas.
Artigo 23. A nós, crianças, não deve ser permitido abandonar a infância quando queremos. O maior crime dos adultos é não nos permitir crescer.
Parágrafo:
Da mesma maneira é um crime e uma obstinação dos pais e familiares que nós
sejamos crianças toda vida.
Artigo 24. Qualquer generalização que se faça
sobre a infância é um engano. Nós, crianças, não passamos por uma
"idade" que se chama infância. A infância não é uma idade.
Fonte:
Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil - Suplemento Publicado pelo
CERLALC (Centro Regional para o Fomento del Libro em América Latina y Caribe)
no Boletim EL LIBRO.
Autor:
Femando Vásquez Rodriguez.(Declaração apresentada na área de
"Lectoescritura" Mestrado em Educação. Santa Fé de Bogotá, agosto 27
de 1993)
Tradução:
Beatriz Dusf e Iraides Coelho.